A ação de conhecer na infância é
pautada no fazer, nos diferentes modos de sentir e descobrir as qualidades
sensíveis da matéria, tal como pontuava Gaston Bachelard (1991). Um fazer
intrinsecamente associado à atitude lúdica, a curiosidade, a observação da ação
e reação desencadeadas, instigadas pelo encontro intimo e intenso, neste caso,
dos bebês com a argila.
A cada novo encontro das crianças
pequenininhas com a argila, novos desafios lhe são colocados, apresentados.
Isto faz com que elas sejam provocadas de modos diversos pelas qualidades da
matéria. Elas já se aventuraram pela lama e criaram uma trama visual única como
a divulgada na postagem anterior, na qual mergulharam de corpo inteiro
reafirmando o prazer em brincar com a água e a lama, fazer “misturinhas”, de
provar-provocar as forças da imaginação criadora que se faz visível nos gestos
que marcam a argila.
“(...) o barro é um
meio para a imaginação se realizar, fonte constitutiva de imagens, sendo a terra
e a água os elementos “operadores de imagens”, no dinamismo mesmo do imaginar.
O imaginário adquire uma realidade particular na medida em que a imaginação é
geradora não apenas de formas, mas de valores e qualidades que apelam para a
sensibilidade, recuperando para a imaginação seu papel de risco, perigo e
criação, jamais identificada como função evasiva, mas como da transformação: é
jogo de forças, embate entre forças humanas e naturais” (RICHTER e BLAUTH,
2001, p.03).
Formas, valores e qualidades que são
por nós visualizados quando estamos com as crianças no ato mesmo da criação,
mas também quando organizamos os registros por nós elaborados. Uma forma de
organizar e criar outras significações para o vivido é a construção de pequenos
vídeos a partir das imagens fotográficas. Este movimento levou os bolsistas do
projeto: Lucas de Mello e Fernanda Hartmann, a assumirem também o papel de “produtores”
destas visualidades audiovisuais. Uma proposta desafiadora para ambos,
considerando que os mesmos nunca haviam trabalhado com programas de edição de
imagens, construído roteiros ou mesmo participado de processos semelhantes na
vida acadêmica ou particular. Uma tarefa que, segundo eles os possibilitou
conhecer e lidar com linguagens que no curso normal de formação acadêmica não tiveram
a ate então a possibilidade de conhecer. Esta proposição, na sua execução, nos
leva (coordenadores e bolsistas) a refletir sobre que observamos e registramos,
a perceber com maior clareza a forma como estamos nos relacionando com os bebês,
como estamos orientando o processo, nos colocando nele. Assim, compartilhamos
com vocês os vídeos produzidos pelos bolsistas e que fazem parte deste processo
do nosso percurso de documentação do Projeto, buscando dar visibilidade de processos
imaginativos geradores “não apenas de formas, mas de valores e qualidades que
apelam para a sensibilidade, recuperando para a imaginação seu papel de risco,
perigo e criação” (RICHTER e BLAUTH, 2001,p.03).
O processo de documentação dos
fazeres com os bebês tem nos possibilitado, cada vez mais, (re)significar a
beleza sensível das suas descobertas e das visualidades que são engendradas no
embate entre as suas ações e os blocos de argila, ou ainda, das suas ações com
as misturas de cores diversas criadas com terra. É preciso lembrar que a
documentação pedagógica não é uma “observação da criança”, mas é uma tentativa
de olhar e compreender o que esta acontecendo na pratica pedagógica e o que os
bebês são capazes de criar sem qualquer estrutura de normas e expectativas
predeterminadas ou fixadas.
Este processo permite a
construção de uma proposta pedagógica reflexiva e comunicativa e coloca todos
os adultos envolvidos na construção de um relacionamento ético entre nós mesmos
e a comunidade de modo mais amplo. Ao mesmo tempo, a documentação é
indispensável para os discursos edificação de significados que temos divulgado
neste blog e em outros espaços de discussão e reflexão sobre as práticas
artístico-pedagógicas com os bebês. Assim, assumimos e compartilhamos a
responsabilidade pela construção destes significados, sendo que eles nos
permitem chegar às nossas próprias decisões e construir as criticas sobre elas.
Tendo em vista que a documentação
é compreendida por nós como construção, as visualidades que a compõem,
igualmente são assim compreendidas. Ou seja, não representam “a realidade”, mas
o que conseguimos captar dela, o que escolhemos registrar dela. Assumimos então,
que ela é parcial, seletiva e sempre contextual.